sábado, 30 de maio de 2009

O Canto e as Armas

Manuel Alegre é um dos grandes poetas Portugueses. O pequeno livro "o Canto e as Armas", na verdade é um livro enorme. É para mim fantástico ouvir estes poemas pela voz de Alegre com a guitarra de Paredes em fundo ou pela voz e musica de Adriano.


RAIZ

Canto a raiz do espaço na raiz
do tempo. E os passos por andar nos passos
caminhados. Começa o canto onde começo
caminho onde caminhas passo a passo.
E braço a braço meço o espaço dos teus braços:
Oitenta e nove mil quilómetros quadrados.
E um país por achar neste país.

PEREGRINAÇÃO

Depois o bosque se fez barco. E ramo a ramo
Foi leme e quilha.
Era um povo a perder-se por seu amo
Que perdia o seu povo de ilha em ilha.

Eras tu que morrias na morte das lavras
Eras tu que ficavas cada vez mais nu.
E a cada terra onde chegavas eras tu
Que morrias na terra que deixavas.

Porque nenhum Brasil foi teu. Nenhuma
Ilha a tua. Em cada barco terra a terra
Perdeste a pátria por achar. E guerra a guerra
Por tuas armas te perdeste. E o mais foi espuma.

E o teu sangue corria por dentro das lavras.
Construías muralhas e ficavas
Pedra a pedra cercado. E desarmado
Eras tu que morrias nas batalhas
Enredado nas armas que tecias:
Malhas onde sem glória te perdias.

E as fogueiras ardiam. Inventavas fantasmas.
E era o teu corpo o corpo que queimavas.
Eras tu que cantavas dentro das palavras
Tecendo desarmado o canto e as armas.

E ALEGRE SE FEZ TRISTE

Aquela clara madrugada que
Viu lágrimas correrem do teu rosto
E alegre se fez triste como se
chovesse de repente em pleno Agosto.

Ela só viu meus dedos nos teus dedos
Meu nome no teu nome. E demorados
Viu nossos olhos juntos nos segredos
Que em silencio dissemos separados.

A clara madrugada em que parti
Só ela viu teu rosto olhando a estrada
Por onde um automóvel se afastava.

E viu que a pátria estava toda em ti.
E ouviu dizer-me adeus: essa palavra
Que fez tão triste a clara madrugada.





Podem ler aqui no blog do Cupido.

5 comentários:

Noémia disse...

É sempre agradável ouvir boa poesia, acompanhada ou não de música.
Traz-me sempre uma certa nostalgia ouvir estes poetas de intervenção... e saudades ...porque afinal, nos tempos que correm, bem precisavamos de umas vozes de qualidade a intervir! :)

cupido disse...

Bem, parece que ninguém se chega "à frente" nos comms...

Confesso que não consigo encarar o manel alegre como poeta de intervenção. Para mim, é "apenas" um grande Poeta.

Se o Adriano, o Paredes viram neste livro filão para comunicarem, melhor.

mas, que estes poemas são excelentes, são.

Anónimo disse...

O Compartilhando Leitura está no ar. Quando puder faça uma visita e deixe um comentario!
Obrigada

compartilhandoleituras.blogspot.com

Cláudia Marques disse...

Adoro Manuel Alegre, como Poeta e como Pessoa. Admiro-o bastante, e só tenho pena que ele não tenha tido "coragem", recentemente, para tomar uma atitude mais incisiva, se bem que compreenda os seus motivos.

Bem, mas indo à poesia, que é o que interessa aqui, é dos primeiros poetas por quem fiquei fascinada, e não parei de o admirar até hoje.

Nina disse...

Gosto muito deste poeta, que descobri recentemente.
Gosto, especialmente, de:

"Há um caminho marítimo no meu gostar de ti.
Há um porto por achar no verbo amar
há um demandar um longe que é aqui.
E o meu gostar de ti é este mar."

http://meninadecachos.blogspot.com/