Perdi a conta aos meses que este livro "dormiu" sobre a minha mesa de cabeceira, as vezes que o meti dentro da pasta de trabalho e o levei comigo para aproveitar momentos de espera, as viagens de carro para algures mais longe daqui, os passeios do quarto para a sala e vice versa... Conseguia ler quatro ou cinco páginas, fechava-o para o voltar a abrir dias depois. Tentava-me a abri-lo a cada noite, ao deitar, mas o efeito do bendito Xanax XR impedia-me de seguir a leitura. O sono chegava veloz e vigoroso e o pobre livro acabava por cair... abandonado no tapete, ao lado da cama...
- Cenourita Maria... tu que sempre, toda a vida e mais seis meses, devoraste livros como petiscos que te enchem a alma... e desde o aparecimento daquela maldita doença da panela, não consegues pegar na leitura e levá-la até ao desfecho da história ao longo de um período razoável??? - em coro, todos os livros que esperam na prateleira da estante, ansiosa e pacientemente, pelo seu momento de glória...
Até que, chegou o dia em peguei nele, retirei-lhe o marcador, recomecei a leitura desde a primeira página e o devorei... que nem uma leoa faminta de alimento com substância!
"Tiro a tampa do frasco de cristal e deito o conteúdo dentro da banheira, que se vai enchendo devagar. Através da transparência da água, o roxo escuro dos sais cristalinos torna-se lilás pálido. Os elementos decompõe-se e recompõem-se de novo. Tranparência e cor. Fluxo e extase.
(...)
Aprisiono a barriga e os seios num soutien e numas cuecas pretas, enfio os braços nas mangas de um vestido de veludo cujo colorido roxo escuro se anima sob a luz, estico-o nos joelhos e no traseiro, viro-me para cá e para lá em frente do espelho e subitamente fico cheia de satisfação - algo na forma como o vestido cai sobre o corpo, esconde o seu defeito e torna-o protegido, forte e até agressivo. Que atrai a atenção e inspira respeito.
(...)
Os segredos de Ninush são segredos meus. O meu compromisso para com ela e os seus segredos é absoluto. Tal e qual como naquele voo em que nos conhecemos, o meu anfitrião e eu não temos agora o menor problema em encontrar assuntos de conversa e sobrevoá-los, encantados de nos escutarmos um ao outro, de vermos o nosso próprio reflexo nos olhos do outro.
(...)
O tigre vira-se para ir atrás delas, mas de repente percebe, pára, crava os olhos de limão transparentes nas visitas e não se mexe. O lugar dele é aqui. Esta é a sua casa. Coitada da Micaela, coitados de todos os amantes, sejam eles quais forem! A barriga do desejo nunca se saciará, mas que definida e terrível se torna a fome com a aparição do objecto que a desperta.
*
O tigre é um animal em vias de extinção.
*
(...)
Não há passado nem futuro, esperança ou medo. A viagem que temos diante de nós é longa e não é certo que algum dia cheguemos ao nosso destino."
( ...)
A leitura flui com o encanto da escrita de Alona Kimhi e a história mágica que o livro encerra. Um romance excêntrico, louco, inquietante, divertido, delirante...
Adorei e Recomendo!
Podem ler aqui no blog da Cenourita.
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